Comunicado expressa posicionamento do audiovisual negro para que o projeto de lei seja aprovado com medidas de reparação histórica
A
Associação de Profissionais do Audiovisual Negro (APAN) emite hoje (16) uma
carta solicitando ao Parlamento uma atenção especial à regulamentação do VoD
(Video on Demand ou Streaming). O apelo é para que o PL 8.889/17, projeto que
será votado na Câmara dos Deputados visando essa regulamentação, leve em conta
a oportunidade única e histórica de promover uma reparação do racismo –
estrutural e institucional – que ainda persiste no mercado audiovisual
brasileiro e, consequentemente, no imaginário nacional. Afinal, se o setor
audiovisual não estiver devidamente regulamentado com Ações Afirmativas
estabelecidas por lei, ele mesmo se tornará um produtor de desigualdade social.
Por
isso, é urgente a reparação histórica para que a população brasileira, em sua
diversidade, se veja cada vez mais nas telas, e que profissionais e
empreendedores negros integrem efetivamente a dinâmica econômica do setor,
juntamente com outros grupos. Nesse sentido, a APAN reconhece a importância da
Câmara dos Deputados para a garantia e os avanços da democracia no Brasil,
contando com os esforços do conjunto de parlamentares, lideranças em suas
regiões e partidos, para construir uma Democracia Antirracista em um país de
maioria negra.
Desde
o início deste século, houve um crescimento de cerca de 700% na produção
independente brasileira, resultando em um aumento significativo na geração de
emprego e renda no setor audiovisual. No entanto, dados alarmantes revelados
pelo Boletim GEMAA (2017) e por um estudo da ANCINE (2018) destacam a
sub-representação e a exclusão sistemática de pessoas negras, especialmente em
cargos de direção e roteiro no cinema brasileiro. Entre 1970 e 2016, a direção
de filmes com mais de 500 mil espectadores em sala de cinema não incluiu
pessoas negras, e apenas 10% foram dirigidos por mulheres brancas. Além disso,
a discrepância é evidente na distribuição de recursos públicos. Em 2016, todas
as obras que receberam incentivo por meio de recursos públicos geridos pela
ANCINE foram dirigidas por pessoas brancas, e 98% dos roteiros também foram
escritos por pessoas brancas.
Por
isso, a APAN reitera a urgência de ações que visem à justiça social e promovam
a equidade no setor audiovisual, combatendo o racismo e as iniquidades que
impactam desproporcionalmente a cadeia produtiva e a representatividade nas
telas. A reconfiguração do imaginário brasileiro e a valorização da pluralidade
são medidas cruciais para o efetivo combate às desigualdades estruturais do
país.
Embora
seja possível observar um aumento da participação negra no audiovisual na
última década, com crescimento na produção cinematográfica, conteúdo para
plataformas e na área acadêmica, ações fruto de lutas históricas e políticas
públicas afirmativas, a crise econômica aprofunda as desigualdades,
especialmente para a população negra, que compõe a maioria do segmento
populacional de menor renda. Por isso, garantir a presença e a viabilidade
econômica da produção negra exige ações concretas que combatam o racismo e as
desigualdades estruturais.
Nesse
sentido, a APAN defende:
–
Políticas Afirmativas para ampliar a participação de profissionais e
empreendedores negros, com a manutenção no texto do PL 8889/2017 do trecho
relativo à destinação de porcentagem mínima de 10% para a “produção de
conteúdos audiovisuais produzidos por produtoras vocacionadas e cujas equipes
criativas sejam majoritariamente formadas por pessoas pertencentes a grupos
incentivados”.
–
A valorização das produtoras brasileiras independentes, com a garantia de
manutenção dos direitos patrimoniais das obras para as empresas e para os
autores. Hoje, sem a regulação, os contratos com as plataformas estrangeiras
determinam que as produtoras e autores brasileiros independentes limitem-se à
prestação de serviços, sem usufruir, por exemplo, do lucro com a
comercialização internacional das obras de sua própria criação.
–
Uma cota mínima de 10% para a produção independente brasileira nos catálogos
das plataformas, com destaque nas telas iniciais e nos mecanismos de busca, por
exemplo, para garantir a liberdade de escolha de espectadores brasileiros. Da
forma como está hoje, sem a regulação, os conteúdos brasileiros independentes
ficam escondidos nos catálogos.
–
A cobrança da CONDECINE-VoD com alíquota mínima de 12% (doze por cento) para
garantir os investimentos para o desenvolvimento do setor audiovisual
brasileiro. O Brasil é o segundo maior mercado para as plataformas de streaming
no mundo e a cobrança de taxas para o fomento do audiovisual local existe há
mais tempo em outros países, como na Europa e na América Latina, sem que isso
signifique aumento expressivo para os consumidores. Pelo contrário, essa
taxação é a garantia da qualidade e da diversidade dos conteúdos e do
desenvolvimento econômico local.
–
Estímulo à nacionalização, por meio da previsão de cotas regionais para
distribuição dos valores arrecadados com a taxação dos streamings. Atualmente,
cerca de 60% do fomento público concentra-se no Rio e em SP. A APAN apoia a
manutenção de cotas regionais.
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